08/10/08

Pontos de Vista

- Dependência e posse andam de mãos dadas.

-Sim, para haver quem dependa, tem que haver quem possua. Ou para haver quem possua, tem que haver quem se deixe possuir.

- Exactamente! E às vezes o sentimento de posse vem de quem depende. E acaba por depender, também esse, de alguém que depende dele...

- Há quem abdique do que realmente é para se transformar naquilo que o outro quer, deixando-se engolir pelo outro. Acho que se acaba por ir parar à velha questão da falta de amor próprio e de auto-estima. Não acreditar que se tem mais-valias como qualquer outra pessoa e que se é importante.

- Já me aconteceu... A dada altura ía sendo engolida... Saí a tempo... Mas ficaram marcas.

- Pois, ficam sempre. Principalmente quando levamos toda a nossa vida a lutar para que isso não aconteça.

- Mas passam, porque eu sou facilmente reciclável em relação aos maus momentos.

- Isso é bom. Gostava de ter esta capacidade um bocadinho mais apurada.

- Sabes?... Eu sofro muito, descabelo-me, choro torrencialmente, custo a esquecer, mas ultrapasso. Impeço que o sofrimento me castre os sonhos e a vontade de amar e ser amada.

- Pois. Eu chorava, agora não choro. Eu esquecia, agora não deixo o sofrimento chegar. E deixei que o medo de sofrer e de ser rejeitada me castrasse os sonhos e a vontade de amar e me deixar ser amada.

- Pois, eu cá acho que as pessoas devem deixar que o sofrimento lhes aconteça. Quanto mais não seja fá-las crescer e depois é olhar para a vida pensando no lado positivo de cada momento menos bom.

- Deve ser isso...

- Mas tu não deixas que eu sei.

- Pois...

- Deixa só um bocadinho...

- Não consigo, não sei como se faz.

- Respira fundo... Ventila... Deixa correr e sente... Se chorares não faz mal, porque o meu ombro estará sempre aqui e sozinha nunca estarás. Se sorrires será lindo e eu estarei cá na mesma para me sentir feliz por ti.

- Parece simples. Mas tenho uma cabeça que está constantemente a sabotar-me.

- E é. Esquece a cabeça.

- Mais uma coisa que não sei fazer.

- Sabes, sabes... Não penses, sente.

- Aprendi a controlar e não deixar sair o que vai dentro do coração, que muitos acham que eu não tenho, e agora dá nisso.

- Eu cá sou das que acreditam que tens o coração escondido. Só isso.

- Para além disso, não sei se os outros merecem aquilo que tenho para dar. E, acima de tudo, se eu mereço o que os outros têm para me dar.

- Se não merecem acabamos por sofrer mas também acabamos por ser mais astutas na identificação de cabrões.

- Achas que passamos a identificá-los melhor? Eu não sei.

- Acho que sim. Sem dúvida absolutamente nenhuma. Além de que conseguimos perceber se a outra pessoa está no mesmo comprimento de onda que nós. Se não está (seja qual for o motivo) é sair fora.

- Acho que chega uma fase em que deixamos de acreditar na nossa capacidade de avaliar o carácter dos outros. E isso leva-nos ao descalabro total. Já que em tudo o que os outros dizem procuramos segundas intenções. Ouvimos aquilo que dizem, filtramos, filtramos, filtramos e no final nada passa. Achamos que tudo não passa de mentiras.

- Esquece as segundas intenções, mas interpreta a comunicação entre linhas (que podem não ter segundas intenções). É uma questão de: ou agir fria e descontraidamente; ou agir observando, interpretando, conhecendo... Mas igualmente sem medos, nem reservas. Qualquer coisa que faça soar o alarme é agir em conformidade com o desaforo. Sim porque somos boazinhas até ao momento em que nos pisam os calos ou se esticam...

- Acho que passei a ter mais medo de mim do que dos outros. Muitas vezes parece que acabo por magoar os outros para não ser magoada, que acabo por usar os outros para não ser usada.

- Pois, eu sei e sinto isso mesmo em ti... Mas vai passar.

- Já tive mais esperença nisso.

- Nem uma coisa, nem outra é boa... Vai mudar... Se eu digo é porque vai.


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