Vou à janela e enquanto espero a noite chegar vejo a paisagem dourada que se estende à minha frente. Neste momento de final de tarde o tempo parece parar. Tudo é calmo e sereno, com uma musicalidade que nos faz sonhar, que nos faz ansiar ainda mais pela noite.
Chamo o anjo da noite, aquele que cura todos os males. Que me faz esquecer o dia, a realidade e tudo o que tem de aborrecido. Fico feliz quando o sinto chegar. O sonho vem sempre atrás.
É no sonho que liberto todas as minhas amarras. Liberto a minha mente de medos e preconceitos.
O sonho é como uma realidade à parte. Todos temos uma e não a partilhamos. É uma realidade que vivo sozinha, onde exprimo todas as minhas emoções, sentimentos e onde as frustrações não existem. Nele nada é proibido.
No entanto, é uma realidade interrompida a cada dia pelo despertador, pela moral, pelo dever e pela obrigação de ter de conviver na realidade por todos partilhada.
No sonho não existe noção de tempo. Vive-se para o presente. é um momento infinito e indeterminado. É um espaço único e livre. Só meu, onde sou o seu centro. Tudo gira à minha volta. O que importa sou eu, as minhas sensações e as minhas emoções.
Mesmo não estando presente, no sonho há algo que invariavelmente se refere a mim. Pode ser uma subtileza, um pequeno objecto, uma característica física, mas é algo que é um exclusivo meu. Algo que torna o sonho no 'meu sonho'.
O instante em que acordo é o mais triste para mim, pois neste momento tudo o que se passou durante a noite desaparece. Chega o anjo da manhã, aquele que nunca chamo, e faz-me esquecer tudo o que sonhei.
Penso na vida e nas possibilidades que a recordação de um sonho me pode trazer. Tento recordar o que sonhei, mas surge sempre na minha mente um enorme buraco negro, vazio e perturbante, que me leva a pensar, por breves instantes que estou perdida na loucura que assola o mundo.
Olho uma vez mais pela janela a ver se a noite já chegou e descubro que chegou o dia e a paisagem azul e branca da manhã.